Da série Crônicas do Cotidiano - continuação
Livre do incômodo de ter alguém sentado sobre a cervical, a passageira do guarda-chuva se vira contra o cobrador. "Você devia ter mandando ela sair de cima de mim, onde já se viu alguém viajar com a bunda de outra pessoa na cabeça. Você devia ter mandado ela sair de cima de mim..." O cobrador, tão cansado quanto os outros passageiros, depois do dia de trabalho árduo, se defende da única forma que sabe, usando um mecanismo de defesa muito comum nos dias de hoje: pela omissão. "Minha senhora, aqui nesse ônibus só tem adultos, as pessoas sabem o que podem e o que não podem fazer, eu não vou ficar dando 'regulagem' em ninguém. Se a senhora queria que ela saísse, mandasse ela sair, eu não tenho nada com a vida de ninguém". A passageira mais velha, em Salvador, pessoas na faixa etária dela e com o seu grau de simpatia também tem nome, vamos chamá-la pelo nome, a "tia" do guarda-chuva sustenta o bate-boca com o trocador de ônibus. Uma grita de cá, o outro escorrega respostas não comprometedoras de lá. "Vou denunciar na empresa de ônibus". "A senhora pode denunciar, pode dizer que fui eu quem disse que não me meto em briga de passageiro". Ninguém percebeu que o "eu" do cobrador não tem nome ou sobrenome e portanto, para efeitos de denúncia na empresa de ônibus não vale absolutamente nada. Ringue armado, outros lutadores se apresentam para a disputa. A adolescente, aluna de uma escola particular e com uma mochila dez vezes maior que ela nas costas, toma partido do cobrador. Outras senhoras, "tias" como a do guarda-chuva, defendem a colega ultrajada pelas nádegas da "guete", que a uma altura dessas, já deve ter chegado em casa e nem sonha que foi pivô de tamanho barraco.
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