domingo, 14 de setembro de 2008

Felicidade Clandestina

É o nome do conto que mais gosto. Felicidade Clandestina, de Clarice Lispector. Li a primeira vez quando devia ter uns 12 ou 13 anos. A lição que aprendi naquela época perdura até hoje. Tenho pressa em querer, mas nenhuma em degustar, esgotar o objeto desejado, consumindo-o de uma vez. Talvez por isso nunca assista filmes que tanto quero ver na estréia. Prolongo a posse, para prolongar o prazer. Ensaio sobre a cegueira - baseado no romance homônimo de José Saramago, meu livro de cabeceira, lido, relido e rabiscado (sim eu rabisco nos meus livros por mais que os puristas queiram fazer do livro um templo, meu templo tem as paredes pixadas pelas minhas dúvidas, pelas minhas descobertas. Eu tenho a alma pixada pelos meus livros)-, estreiou nos cinemas da minha cidade na última sexta-feira. Tenho uma amiga que correu para ver, respeito e admiro os amantes ávidos. Suas impressões estão aqui. Não corri porque me sinto como a menina de Felicidade Clandestina. No conto de Clarice, depois de ansiar por ler As Reinações de Narizinho, que uma amiguinha possuia, mas deixava pegando mofo na estante só pelo prazer de torturar a colega que tanto queria ler, finalmente o livro é emprestado pela mãe da torturadora, que ao dar o livro para aquela alma ansiosa acrescenta: "Não tenha pressa em devolver, fique o tempo que você quiser". A protagonista chega em casa em estado de graça, mais feliz do que se deveras tivesse recebido o livro de presente e, ao contrário do que espera o leitor, não se atira para dentro das páginas de Reinações como um sedento no deserto. Ela espera, namora o livro, saboreia a posse, folheia as páginas, lê trechos, volta ao início, sempre com a frase da mãe da amiga ressoando aos ouvidos "fique o tempo que quiser". Uma pessoa que amo profundamente quer muito assistir Ensaio sobre a cegueira comigo. Aprendeu os caminhos do livro através de mim. Espero essa criatura tão amada ter tempo, para que juntas possamos compartilhar o filme, assim como compartilhamos a compreensão do romance.

2 comentários:

Palatus disse...

Ah, você também ama Lispector também? São dois...Li o referido conto e senti-me extasiado...ótimo é pouco para defini-lo com tal adjetivo. Guimarães certa vez disse - uso minhas palavras - o bom de uma viagem não é a saída nem a chegada, mas a caminhada, o processo. O prazer se instaura aí, né? Adorei sua reflexão...quero assisti ao "Ensaio sobre a cegueira", mas devo ir depois.
Ah, será uma honra ter o Palatus na tua lista.
Bjo

Andreia Santana disse...

Bem-vindo ao clube!!